quinta-feira, 29 de julho de 2010

O que terá acontecido a Teddy Daniels?



Agora eu posso começar um post de maneira chique. Assisti esse filme em Londres, durante minha curta aventura européia. Bancando mais o intérprete do que espectador, o filme acabou no cinema e eu tinha uma conclusão.

Revi o filme em casa na última noite, e tirei duas conclusões, uma sobre o final e outra sobre a graça, o prazer de assistí-lo. Ilha do Medo é um filme aberto, daqueles que você senta num banco de praça com seu melhor amigo, acende um cigarro e pergunta: "Diz aí, Jão, que carai aconteceu com o DiCaprio naquele filme?".

Não é o primeiro e nem será o último a acabar e deixar a gente cheio de dúvidas. Buscar explicações, obter conclusões e afirmar o que realmente aconteceu após duas horas de produção, é procurar defunto onde não tem velório.

Os pseudo-cults formularam teoria, os formadores de opinião pariram a suas. Beleza, tá legal. Mas ninguém é dono da verdade, nem eu. Por isso é que a maioria esqueceu de aproveitar o filme em ritmo de espetáculo, o que ele é, do começo ao fim. Alguns acham que o filme é sobre loucura, outros sobre o medo. Tô na segunda opção. É um filme de terror.

Chique, bem pago e produzido, classudo, mas é terror pra ser consumido pela massa e apreciado com carinho por quem entende do compasso. Não se prova o contrário. Tem sangue, deformidade e até morte de criança, coisa altamente apelativa desde que o mundo é mundo. 

DiCaprio é o herói e sua postura diante das ameaças enfrentadas é a mesma de Jeff Daniels em Aracnofobia, o cara com medo de aranha numa cidade cheia delas.

Pra iluminar e atentar, DiCaprio não fica louco. Ele já é, desde a guerra, desde a morte da esposa. O roteiro faz umas pegadinhas até o fim, pra coisa ficar melhor, mostra o descontrolado buscando controle no olho do furacão. Desejo de vingança se confunde com paranóia, traumas de guerra geram teorias de conspiração, o horror... oh, o horror! Seu personagem vai perdendo a cabeça aos poucos, talvez ele seja até o candidato da Manchúria. E se você não sabe quem é, vai ali no Google que ele já te explica.

Passado o problema, comentar a trama labiríntica e vivaz, é sacanagem. Scorsese fez um filme para impressionar, tão exagerado e charmoso quanto Cabo do Medo. Deixou a dúvida no ar priorizando o texto de Dennis Lehane, como um cagaço final, coisa do gênero terror, fartamente homenageado aqui junto com o noir. Kubrick, Val Lewton e nem mesmo Michael Powell escapou da honraria. 

O cenário é outra atração. Graças ao clima de pavor e a brilhante direção de arte de Dante Ferretti, ele parece abrigar uma ameaça ancestral além dos loucos encarcerados. A música escolhida a dedo, piora a situação. Uma peça de Penderecki (compositor que também estava na trilha sonora de O Exorcista) define toda a ação e marca o ritmo do nervosismo. Ouví-la sem o filme, é pior.  

O elenco vale a espiadela. DiCaprio ainda tem o que melhorar. Ele passa quase o filme todo com cara de constipado, mas volta e meia tem um arroubo de brilho. Mark Ruffalo é o mais acéfalo dos parceiros. As primeiras escolhas de Scorsese para os papéis eram melhores, Robert Downey Jr. e Josh Brolin. Bem melhores.

No jogo de cena, Ben Kingsley dá o tapa e esconde a mão. Max Von Sydow colabora na dobradinha ameaçadora. Os dois estão ótimos. É a dupla "Embrulha e Joga Fora" da vilania. Para os capangas, Scorsese escolheu John Carrol Lynch e Ted Levine, ícone do terror, o Buffalo Bill de O Silêncio dos Inocentes.

Emily Watson pode ser ou não a maluquinha desaparecida, Patricia Clarkson também. Jackie Earle Haley, feio como só ele poderia ser, é a voz da razão. Elias Koteas é o fantasma, assombrando DiCaprio junto com Michelle Wiliams. Robin Bartlett é a paciente nervosa que matou o marido a machadadas. Seu movimento em cena somado ao final do filme, faz parte da minha solução.

A sua, eu gostaria de saber. Você assiste e pensa o que bem quiser. Quem sabe até, a gente conversa sobre o filme, trocamos idéias e rimos após isso tudo.

Só não venha me dizer que você TEM certeza.

segunda-feira, 26 de julho de 2010

As Mulheres de Fassbinder


LOLA

A minha paixão por Lola é antiga. É um dos primeiros filmes "europeus" que eu assisti na vida, nos idos do VHS. Barbara Sukowa continua arrasando meu coração, assimo como Fassbinder, o diretor da peça e cineasta que eu respeito pra burro, assim como Peckinpah, Kubrick, Fellini, Bergman e companhia. Lola, realizado em 1981, é a segunda parte da trilogia iniciada em 1979 como O Casamento de Maria Braun e finalizada em 82 com O Desespero de Veronika Voss.

Maria, Lola e Veronika são três mulheres diferentes, mas todas viveram na época do pós-guerra, na reconstrução da Alemanha nazista pela mão de Adenauer. E mais importante que isso, todas são divas teutônicas inspiradas nas starletts dos anos 50, dos filmes de Douglas Sirk. Até nisso Fassbinder toma cuidado, homenagear uma época dourada do cinema americano e amargar na crítica social.

O roteiro de Lola é o que melhor representa o período de reconstrução da Alemanha. Até o triângulo amoroso contado aqui gira em torno de negociatas que visam o bem comum.

Barbara Sukowa é Lola, como Marlene Dietrich, e destrói outros corações além do meu. Sua personagem é uma mulher de negócios esperta e calculista, prostituta ambiciosa divivida entre Schukert, um malandro construtor público que superfatura obras e Von Bohn, o novo chefe de departamento que representa o puritanismo. Schukert não quer perder a teta financeira posta em risco com a chegada de Von Bohn e Lola, no meio dos dois, vai dar sua mordida e conseguir a emancipação financeira.

Todos estão dentro de um novo sonho econômico, uma nova Alemanha mais simpática e sem o constrangimento causado pela febre nazista. O povo que perpetra o sofrimento do pós-guerra, faz de tudo para recomeçar, buscando cultura até num puteiro. Os cenários estão sempre em construção, escuta-se o barulho de obras e as paredes estão sempre esburacadas. Até as piranhas do bordel estão preocupadas com investimentos. Os poderosos fazem negociatas em meio a bebedeiras e mulher pelada, deixando claro que se o destino da cidade está em vias de ser resolvido numa casa de rendez-vous, então o serviço público também é uma putaria.

A corrupção e a prostituição caminham de mãos dadas e todo mundo quer o seu 10%.

Tecnicamente Lola é irrepreensível. Fassbinder fazia teatro filmado. Seus atores ensaiavam e a maioria das cenas era feita em tomada única, prova de que ele acreditava no potencial do elenco. A fotografia de Xaver Schwarzenberger marca em cores quentes que beiram a breguice, o perfil dos personagens. Lola tem uma luz rosa, enquanto Von Bohn está sempre em azul.

Barbara Sukowa e Armin Mueller-Stahl brigam seriamente pela atenção em cena.

Mario Adorf é o rotundo Schukert, a melhor coisa do filme. Misto de cafetão e magnata, apaixonado por sua cocota e morrendo de medo de perder a grana. Matthias Fuchs é o vingativo e mal amado Esslin, que joga tudo no ventilador, também na esperança de conseguir o que é seu. Rosel Zech, bem antes de viver Veronika Voss, é a preconceituosa Frau Schukert.

A trilha sonora é de Peer Raben, pra variar. Entre as canções e cenas do filme, duas cantadas por Barbara Sukowa, ficam pra eternidade: a primeira é Am Tag Als Der Regen Kam, no início e pra fechar bonito é The Capri Fisherman, onde Lola, possuída e descoberta, agita o boteco num frenesi de loucura inesquecível.

Matar ou não matar, eis a questão


TEATRO DA MORTE, também conhecido como AS SETE MÁSCARAS DA MORTE

Coloca aí num caldeirão: Shakespeare, sangue, humor negro, Inglaterra e gente feia. Aí chama o Vincent Price pra tocar a festa, reprisando o eterno papel do vingador amargurado que volta para destruir aqueles que lhe passaram a perna. Pronto. É o filme, é uma beleza.

Num arroubo de criatividade, ele agora é um ator shakespereano, o melhor de seu tempo (na sua própria concepção), reduzido a pó de traque por sete críticos teatrais. Crítico não é flor pra se cheirar e Price, faz a alegria dos artistas sacaneados, exterminando todos os seus detritores artísticos, com uma classe de dar inveja até em Jigsaw, o onipresente matador da série Jogos MortaisO charme incorrigível e a voz retumbante, fizeram de Price o vilão que todos adoravam odiar. 

A presença camaleônica permite que ele delicie-se em mil faces e declame Shakespeare alucinadamente entre boas doses de sangue e humor britânico, para fazer a tão sonhada justiça ao eliminar sete críticos impiedosos á risca dos textos do bardo imortal. Ricardo III, Julio César, Cymbeline, Troilus e Créssida, Romeu e Julieta, todos ali, bons motivos para cortar, decapitar, queimar e divertir o público que há de se interessar por algo no filme. O sangue, a palhaçada ou a cultura teatral, é só escolher.  

O elenco de vítimas é memorável, sortido de veteranos do cinema inglês, Jack Hawkins, Michael Hordern, Harry Andrews e Dennis Price. Ian Hendry é a besta que demora a acreditar que Price está botando um fim a bandalheira crítica.

Coral Browne, que casou-se com Vincent Price após as filmagens, protagoniza com o futuro companheiro uma seqüência hilária, onde ele depois de tanta traquinagem, também se passa por homossexual. 

Milo O'Shea é o detetive raivoso, Robert Morley é a bichinha afetada e Diana Rigg, belíssima, é a companheira de maldade.       

Por esse e tantos outros, Price eternizou-se como um dos cavalheiros do horror, um monstro (no sentido literal) tão sagrado quanto Lugosi, Karloff, Cushing e Lee.

E para você, que jamais assistiu um filme de Price, serve de consolo saber que é a voz dele no clipe de Thriller do Michael Jackson?

terça-feira, 20 de julho de 2010

A vida é um laboratório



A MOSCA

Atualização do clássico filme de 58. Sai Vincent Price, entra o nojo e a pústula.

David Cronenberg toca o espetáculo priorizando o suco gástrico. Ele é o mestre melancólico do horror, o barão do sangue e em toda a sua filmografia existem feridas, físicas ou psicológicas, prontas para estourarem na realidade trágica que acomete seus personagens. Cronenberg adora a carne, os machucados, a podridão e o bizarro. Construiu fama chocando a humanidade com seus closes escatológicos nas mazelas da humanidade.

É a realização do pesadelo de Kafka, a verdadeira metamorfose de homem em inseto, da pior maneira, de dentro pra fora lenta e dolorosamente. Ao desafiar a ciência, um pobre homem desce a ribanceira do desespero tomado por uma doença incurável, pior que a morte.

Jeff Golbdlum é o amalucado cientista Seth, que traz na cara a mesma preocupação de qualquer cientista louca de um filme clássico dos anos 50 ou 60: revolucionar a humanidade, impressionar o mundo e a ciência. Para isso, ele constrói a melhor máquina de todos os tempos, a cápsula de teletransporte e como um bom Dr. Frankenstein da nova era, fará de tudo para assegurar a eficiência de seu novo experimento, inclusive a burrice de testar a máquina por risco próprio.

Ele é um caso raro de boa atuação em filme de terror. Atuando com quilos de maquiagem, Jeff carrega o filme a partir do momento que o monstro interior começa a zumbir mais alto. Adquire habilidades especiais, come açúcar desesperadamente e discursa sobre a mudança da carne e o mergulho no lago de plasma. Pele ruim, manchas no corpo, unhas e dentes que caem atestam que algo está errado e já é tarde para reverter a cagada toda.

Caliphora Vomitoria é a mosquinha que condena a vida de Seth. É o erro de cálculo, o acaso obscuro que coloca o povo em risco. Sua presença insignificante altera o curso da história, seus genes fundem-se com o cientista, que acaba bem fundido.

A transformação do homem não em mosca, e sim em aleijão que abandona as camadas de pele para revelar uma confusão genética, ainda é um parágrafo impressionante na história do cinema. Chris Wallas libera sua criatividade em gosmas que explodem por todo o corpo de Seth. Com razão, papou o Oscar de melhor maquiagem.

Geena Davis é a apaixonadíssima Verônica, que disputa com Goldblum o título do pior penteado em cena. Sua passividade diante do apodrecimento do amado é incômoda, mas ela é apenas uma expectadora, voyeur do horror impossibilitada de resolver tamanho calvário. O melodrama romântico entre os dois quase empaca a história. Fora romance e tome-lhe chinelo na nojeira!

John Getz é o corno enfurecido, que tenta atravancar sem sucesso a relação amorosa e acaba literalmente derretido em sua própria ambição. David Cronenberg, perverso que só ele, aparece em cena como o obstetra, numa cena de grande pavor.

Trilha sonora de Howard Shore, outro que como Bernard Herrmann, sabe musicar o suspense.

Grande sucesso comercial na vida de todos os envolvidos, o filme catapultou Cronenberg ao estrelato hollywoodiano e juntou Jeff e Geena, que foram casados por três anos após as filmagens.

E até hoje, Goldblum é lembrado pela galera como "aquele cara da Mosca, sabe?"

Por mais cômica que pareça a idéia, o dinheiro da produção saiu do bolso de Mel Brooks.

A morte tira férias



Noite passada revi Encontro Marcado, um filme de singular importância na minha vida. Me lembra outra época, sem preocupações. Matei aula pra ir ao cinema, muito bem acompanhado de uma moça hoje já casada, pra ver esse filme. Esse e tantos outros, tantas outras aulas perdidas, enfim. Meu passado não vem ao caso, vamos ficar no filme.

Encontro Marcado é um filme de sensibilidade açucarada, pra derrubar diabético. Mas eu gosto. Eu sou brega, curto Flores De Aço, Laços De Ternura, O Campeão e A Cura. Choro até no Romeu e Julieta do Zefirelli e olha que eu nem escrevi ainda sobre Love Affair com o Warren Beatty e a Anette Bening. Nem só de filme europeu, atores mortos e bons roteiros vive um homem. Eis aí meu lado romântico, sonhador. Outono em Nova York e Doce Novembro também me encantam. 
 (Nossa, quantas referências. Um amontoado!)

Por ser um filme de bonitezas, Brad Pitt assume o papel da morte, em férias e cheio de vontade de descobrir qual a graça do nosso mundo. Fazendo-se de morto, mais até do que devia, Brad diverte em cena comendo pasta de amendoim e atrapalhando reuniões empresariais. Nada burra essa morte que escolhe um milionário para ser seu guia em prazeres mundanos, hein?

A segunda e melhor belezura em cena é Claire Forlani, que Brad encaçapa só por achá-la cheirosinha. Ela é mesmo, linda, um estouro. Para agradar as mulheres, é Brad. Para os homens, Claire e sua carinha de humilde. Carinha, corpinho, tudo em cena.

Marcia Gay Harden e Jeffrey Tambor, altamente empenhados, proporcionam o alívio cômico enquanto Jake Weber garante a chatice que todo filme precisa.

O protagonista é o solene Anthony Hopkins que não parece muito á vontade, proferindo monólogos paternalistas para Brad, numa relação agradável de se ver. No fim, a morte percebe que o cotidiano também tem sua graça, e apesar dos pesares, amanhã há de ser outro dia.

Quando o filme começou a ser desenvolvido em 1995, o papel do milionário que ciceroneia a morte estava com o saudoso Christopher Reeve, afastado do projeto por conta de seu trágico acidente.

O visual não deixa barato. Fotografia de Emmanuel Lubezki e trilha sonora de Thomas Newman. Entre as canções, está o mix de What a Wonderful World / Over The Rainbow na voz de Israel Kamakawiwo'ole, ouvida por meio mundo graças ao filme.

A pegadinha moral é a mesma de Perfume de Mulher, também dirigido por Martin Brest, um cara legal que dirigiu Um Tira da Pesada e Fuga á Meia-Noite. A idéia é remake (originalidade) de um filme de 1934, adaptação da peça do italiano Alberto Casella. Depois desse filme, Brest morreu artisticamente ao parir Contato De Risco, o filme que divorciou Jennifer Lopez e Ben Affleck. 

Só pra constar, em toda a graça do filme, uma cena não orna. Alguém lembra do atropelamento do Brad Pitt quando a morte resolve possuir seu corpo para fins tão românticos? Vai ter grosseria assim lá do outro lado da eternidade. 

Noves fora, o filme nas palavras do grande Costinha: "é uma grafinha."

quinta-feira, 15 de julho de 2010

Caminhando e se lascando...



Então eu assisi A Estrada. Filme interessante, sobre solidão, desespero e a falta de futuro no futuro. Silencioso, com uma criança sofrendo pra garantir o apelo dramático. Algumas cenas chocantes e nervosas, meio sinistras.

O filme, passa-se de vez em quando pra terror. Os recursos naturais esgotaram, o povo ficou com fome e tão tudo se comendo. É um terror, que assusta aos poucos, com bizarrices. Na ausência de zumbis ou criaturas de Lovecraft, entram uns canibais fodões, gerados pela fome e o desespero.  

Viggo Mortensen e Kodi Smith-McPhee são pai e filho, rumando para o litoral em busca de comida, num cenário monocromático e pós-apocalíptico, desculpa para um show de fotografia de Javier Aguirresarobe. Os dias com o ventre da terra á mostra, o céu sem sol e a chuva de bosta, chegaram, o problema silencioso é sobreviver.

Pela primeira vez, Viggo Mortensen me impressionou. Seu personagem, o homem, traz na cara uma fadiga dolorida de inebriar a vista. Lhe confere honra, o personagem com paternalismo de velho guerreiro. Ele sim, é a lenda.

Robert Duvall, Charlize Theron e Guy Pearce, todos com pouquíssimo tempo de cena, impressionam com discrição. Se eu não tivesse lido o nome do Duvall na capa do filme, por pouco não o reconheceria. Quando seu personagem se apresenta como Ely, pensei "aquele que escreveu o livro do Denzel, no filme que parece com esse aqui?". Charlize aparece como a lembrança de dias felizes e Guy, é o redentor.

Adaptação de um romance de Cormac McCarthy, descoberto pela mina de ouro Hollywoodiana após o sucesso de Onde Os Fracos Não Tem Vez, também de sua autoria. Cormac ao lado de Dennis Lehane, é um dos autores mais adaptados do momento.

Tal qual o livro e pra alegria dos leitores, o que realmente aconteceu com o planeta, jamais é explicado. E o pessoal cult que agradeça, ou ficariam todos sem teoria nova para o papo de boteco pseudo-filosófico de sexta á noite.

E quanto a um filme parecer-se com o outro? "Ah, mas A Estrada parece O Livro De Eli!". Não assisti O Livro ainda, mas conformem-se. Um Sonho Possível parece com Preciosa e ambos ganharam Oscar.

That's entertainment!

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Suecando



Liv, sabe que dia é hoje?
É aniversário do Ingmar Bergman, que já desencarnou, mas deixou ao cinema um legado esperto de filmes suecos com pessoas suecas e expressões faciais suecas.
Por isso, piadas sobre filmes suecos.

E esse post é bem sueco, bem away pra você.

terça-feira, 13 de julho de 2010

Um sonho... possível?



Um Sonho Possível


Eu sou uma pessoa teimosa. Noite passada eu quis me torturar. "Vou assistir Um Sonho Possível, ver se essa porra de Oscar tem razão com o prêmio da Sandra Bullock."

Começo a assistir e deu meia hora, pensei: "Qualé! Já vi isso!".

O filme é um primo rico de Preciosa. Aqui, os sonhos de Preciosa viram realidade. Repara comigo: ambos os filmes tratam de pessoas gordas e negras que todos consideram estúpidos, foram abandonados pelas mães e conseguem superar as dificuldades da vida.

A diferença desse aqui é a ausência de fada-madrinha para a gordinha de nome estranho de Preciosa, simples. O drama é batido, previsível em segundos. Até um acidente automobilístico é previsto.


O filme, é um libelo para provar que pessoas lindas, ricas e loiras sabem fazer caridade abaixo de piadinhas racistas de envergonhar quenga de esquina. É para garantir que o Sul dos EUA ainda é um lugar atrasado cheio de códigos, rapapés sociais e preconceitos. E sobretudo, perpetuar a existência desse tipo de filme, popularíssimo entre professores, bacharéis, doutores e donos de boteco que curtem essas teorias de que a vida funciona como em qualquer esporte. O importante é competir.


Momentos bonitos não faltam. Foram concebidos com o cuidado de estar ali, emocionando o povão. Eu mesmo, me emocionei várias vezes com o filme, sem verter lágrimas, porém tocado. A fotografia e a trilha sonora de Carter Burwell também ajudam. Saber que é baseado em fatos reais então, me tira o fôlego.


Nem tudo está perdido. Jae Head como o pequeno mercenário SJ, é a melhor coisa do filme. Um garoto espontâneo misto de empresário, gigolô e cafetão. Kim Dickens é a belíssima Sra. Boswell, que acredita no herói. O protagonista Quinton Aron também é um poço de simpatia, sério. Kathy Bates é a Madame Sousatzka da vez.

A moça que levou o Oscar, Sandra Bullock, não decepciona jamais. Com o excesso de plásticas e os movimentos faciais ainda mais bloqueados, Sandra está errada em todos os níveis, parece uma caricatura de Dolly Parton, sem as tetas e a cara de anjo. Falseando sotaque e forçando a cara de drama (ou seria constipação?), é uma piada sem fim. Nos anos 80, teria arrasado corações com tanta canastrice junto ao pessoal do Dallas. Como num pesadelo, visito o IMDB e descubro que Julia Roberts era a primeira escolha para o papel da loira perua caridosa. Obrigado Jesus. Dois Oscar para Julia seria demais para il mio cuore.

Claro, eu entendi o pito desmoralizador: Temos sempre que proteger o lado cego de quem amamos de verdade.

Lindão, né?
Me emociono...

domingo, 11 de julho de 2010

Aconteceu no Texas

O MASSACRE DA SERRA ELÉTRICA (O original de 74)

Terrorzão rastaquera, feito no quintal de casa, sem a intenção de virar a rola da maioria cult. Traz as mazelas do "dream is over" setentista, quando um passeio agradável vira o inferno na terra, um fim-de-semana com sogra, cachorro e filhos na praia.

Um delíro quente e abafado como o fim do mundo onde se passa a história. Tobe Hooper chamou  um pessoal, que nem Romero e A Noite dos Mortos Vivos, e aconteceu. Pela cara do elenco, todo mundo era chegado num cigarrinho com ciência. Marilyn Burns, bem antes de Jamie Lee Curtis, foi a rainha do grito. Ela alcança decibéis insuportáveis, fato.

É um clássico, não só do gênero terror, mas do cinema. Marcou a época dos filmes cara de pau, feitos no osso do peito. Foi proibido no Brasil e o auê acabou brochando alguns espectadores quando ocorreu a primeira exibição na terrinha.

Ed Gein foi o inspirador da zoeira toda. A introdução falsete de documentário mundo cão, é uma profecia no vozeirão de John Henry Faulk: "A história que verão a seguir... é sobre quatro azarados que dão carona para um doente mental e viram o jantar de uma famíla com hábitos nada saudáveis." 

Começa a perseguição, o choro, o corre-corre e o horror mais puro, em sua forma primária.   

A correção no título é fundamental. A serra funciona á motor. Ninguém vê Leatherface correndo com um fio de extensão nas costas para fazer o bicho roncar.

A perversão instalou-se na casa no fim do campo e de lá nunca saiu. Quatro homens representam o pavor muito bem em cena. Jim Siedow, um ator de formação shakespereana, é o patriarca que acua suas vítimas com uma calma de dar nojo.  Edwin Neal é o arrimo, o retardado da família. John Dugan é o mumificado vovô, sentado o dia todo tarando o esqueleto da vovó.

A honra maior é de Gunnar Hansen, o trator da família. Grande, desajeitado e redondamente débil, ele caça as iguarias para o jantar. O apetite canibalesco fala mais alto que o cérebro (aliás, cadê?) e ele executa suas vítimas de tudo que é jeito: marretadas, ganchos e claro, a serra. Importado da Islândia, hoje é ícone do gore, da nojeira.

Não é um filme para sentir medo. É para cagar nas calças de nervosismo, mais nada. Por mais que se corra, não tem para onde escapar. A serra continua roncando num labirinto seco e árido. Até o gordinho da cadeira de rodas pensa seriamente em levantar e sair correndo, quando encontra Leatherface com aquela carantonha costurada com pele humana. O desespero do elenco dá a impressão de que Tobe Hooper não avisou ninguém sobre o que iria acontecer. Parece Godard, com roteiro escrito a medida que o povo ia morrendo de susto. Alguém sabia que era um filme de terror, mas não esperavam um realismo tremendo.

Scorsese, De Niro e o Cabo

CABO DO MEDO

O inseto da megalomania picou Scorsese. Feliz da vida após o sucesso de Os Bons Companheiros, ele pensou "vou refilmar alguma coisa". Com um tesão desmedido, ele escolheu Círculo do Medo, dirigido por J. Lee Thompson em 1962 e foi com tudo.

Em cada fotograma inflado com um clima tétrico e o terror desmedido, podemos ouvir a voz de Martin Scorsese gritando que sim, ele pode fazer melhor. Ele sabe fazer melhor, e o filme deu certo, deixa assim.

Cabo Do Medo é tão magnético que aumenta os batimentos cardíacos. O material é de um exagero sufocante. Começando pelo contra-regra, passando pelo elenco e por culpa do diretor, todos entregam ao filme uma força brilhante, porém desnecessária se lembrarmos que ele é apenas uma refilmagem. É masturbação visual, ataque de egocentrismo que funciona mecanicamente quando tudo está alinhado. A fotografia de Freddie Francis, a montagem de Thelma Schoonmaker, a abertura de Elaine e Saul Bass (cujos nomes nunca mais se viram nos títulos de um filme, peninha) e a música de Bernard Hermman, atualizada com fúria por Elmer Bernstein, tudo para provar que Martin é o filho número 1 do cinema americano.

A trama é sobre a presença do mal na vida de uma família que não anda bem das pernas. Um estranho impiedoso chega para ruir a estrutura bamba da vida de um advogado vivido por Nick Nolte, um poço de pavor. Suando frio e comendo cigarros, com o passado mais confuso que banheiro de boate gay, Nick passa o filme todo quase entortando pregos com o ânus. Jessica Lange é a esposa, madura e sensual. Os dois protagonizam cenas dignas de tragédias gregas.

Robert De Niro, antigo parceiro de Scorsese, é o capeta. Ao sair da cadeia, o apocalipse vai começar. Vestido de Genival Lacerda, De Niro cita a Bíblia e as leis dos homens enquanto reclama por uma curra sofrida na cadeia. Seu personagem transita entre o terror e a chatice, por isso queremos que Nick Nolte quebre a cara dele, pelos dois motivos.

Illeana Douglas e Joe Don Baker são as infelizes vítimas de De Niro, o FDP indestrutível, de assustar Chuck Norris. O elenco do filme de 62 aparece em pontas. Robert Mitchum é o policial sonolento, Gregory Peck contribui com a festinha e Martin Balsam é apenas Martin Balsam.

O porão está cheio de cagaços e a viagem vale a pena, se contarmos o conflito final dos homens regredidos á barbárie, que por pouco não lava a alma de quem assiste. Resta saborear o medo, pois intencionalmente, o filme é de terror.

Menos Pop, Mais Arte


JACKIE BROWN

Tarantino movie, sem a ousadia e a maluquice de Tarantino. Quentin prova por que pode ser um cara sério, honesto, sem exageros. É o mais sóbrio dos seus trabalhos que se teve notícia até então. Levado que só ele, não podia deixar as homenagens de fora e chamou Pam Grier, a primeira negra a protagonizar filmes de ação nos states, para reprisar seu estereótipo.

Ela já não saracoteia mais como Foxy Brown ou Coffy, mas continua perigosa e durona, com todas as tretas embaladas pela soul music, igual nos anos 70. (Quentin, você não para mesmo né?)

O charme crepuscular do filme está na força e no retorno de  Pam. Cansada, aporrinhada de tudo, na maior fossa e no pior emprego, puxando dinheiro para um traficante de armas. A polícia está no seu encalço, ameaçando o desejo de encerrar a vida com estilo, aposentar-se em paz. Mas Pam ou Jackie, whatever, não vai perder a chance de manter-se em pé. Ela é uma dona invocada, daquelas que encosta cano de arma em saco de bandido e vai passar a perna em todo mundo, se deixar, até no espectador.

A conversa em cena não é tão fiada como em Pulp Fiction, aí Quentin prova que sabe absorver o amálgama literário de cabras como Hammett e Chandler. Claro, o argumento é extraído de um livro de Elmore Leonard, um dos grandes escritores policiais ainda na ativa.

O esquema é bem armado e a trama mantém o interesse, apesar do fogo acender só no final e a ganância por meio milhão de dólares enlouquecer todo mundo num shopping. A edição de Sally Menke vai colaborar para a manipulação do suspense.

Samuel L. Jackson é o patrão motherfucker, Robert Forster é o mané apaixonado. Bridget Fonda e Robert De Niro são as duas bestas que quase colocam tudo a perder, fumando haxixe e trepando de maneira asmática. Michael Keaton e Michael Bowen formam a dupla de policiais metidos a espertos que serão feitos de trouxas, cumprindo a regra cinematográfica destinada a qualquer policial com tal comportamento. Participação comportada de Sid Haig, outra figuraça dos anos 70, como um juiz austero.