segunda-feira, 10 de maio de 2010

Cigarro

Moço, me vê um maço de Charlton Heston?
Bem forte...


Eu fumo Charlton Heston, e você?


Pra @JuDacoregio e o @alex_otan, que fumam Charlton Heston!

Bette Davis chupa...

Pois é... chupa... Se ela chupa, você aí tá esperando o quê?

Mais selvagem que o coração de Clarice

CORAÇÃO SELVAGEM

Uma história de amor amoral, violentíssima e rica em maneirismos típicos de David Lynch. Para a malandragem inexperiente que começa agora no cinema e fica dizendo que Tarantino é o piradão-mor, assistir um filme de Lynch pode ser uma experiência única, pura rendição dos sentidos.

Não é para agradar meio mundo, mas os que curtem filmes esquisitos certamente irão á loucura. A grosso modo, os curiosos, os faroleiros e os racionalistas também estão liberados para aproveitar. Lynch é um artista plástico do calibre de Dario Argento, sempre preocupado mais com o visual e o estilo do que com a história.


Quando a produção do filme começou em 1990, quatro anos depois do sucesso de Veludo Azul, muita gente achou que ele faria um filme comercial, fácil e hollywoodiano. O engano foi bonito e o acerto por conta de Lynch é tremendo.

Todas as aberrações e perversões de Lynch são jogadas na cara, numa mistura de requinte e baixaria, dignas de quem sabe o que faz. Rico em sua loucura e amoralidade, o filme fascina pelo charme estranho, de coisa cult maluquinha. Não sei se já encontraram uma interpretação racional, mas tal como 2001: Uma Odisséia no Espaço, buscar explicação é procurar velório onde não tem defunto. O quente é aproveitar a viagem, o esporro de loucura.

Mais visual do que conversa, mais sexo do que amor nesse emaranhado de tramas e mistérios que surgem, alguns com resolução, outros jogados ao vento. Muito fogo, cigarros, Elvis Presley, erotismo em alta voltagem e um tal de falar muito para não dizer nada. Um espetáculo em ritmo de pesadelo, quente e viscoso, como as paisagens em que a ação ocorre.

Per-versão de O Mágico de Oz, adaptada do romance de Barry Gifford, o filme é embalado pela paixão caipira e ninfomaníaca de Sailor e Lula, um casalzinho que jamais deixará o amor morrer enquanto busca o mágico ou quem sabe, a liberdade. Tanto faz, pouco importa. Os dois se desejam com um calor animal que diverte. E o problema maior do casal apaixonado é fugir de toda a sorte de malucos que cruzam o seu caminho, personagens que só Lynch poderia desenhar vividos com muita inventividade por um elenco intencionalmente caricato que se esbalda na hora de contribuir para o show.

Laura Dern, musa de Lynch no ápice da sensualidade é a pirada Lula. Diane Ladd é a explosão loira de exagero e cafonice, mãe de Laura fora das telas também, teve uma indicação ao Oscar neste filme. Ela é a perversa Marietta, a bruxa-mãe no filme vestida como as atrizes de outrora. Harry Dean Stanton é Johnny Farragut, o amante frouxo e manipulável de Marietta que disputa as atenções da amada com J.E. Freeman, o cruel Marcelles Santos, sempre “numa de matar”.

W. Morgan Sheppard é o mafioso cercado de mulher pelada. Grace Zabriskie é Juana Durango, a psicopata manquitola saída de um pesadelo e que tem orgasmos quando elimina suas vítimas ao lado do parceiro Reggie, vivido por Calvin Lockhart.

Sherilyn Fenn, com jeito de boneca de porcelana, é a garota arrebentada numa rodovia após um acidente e está em cena apenas para dar vida á uma fantasia de Lynch, que critou a tal cena do acidente, pois sempre quis saber como seria uma boneca de porcelana quebrada!

Isabella Rosellini feia e desgrenhada, é Perdita Durango, a irmã de Juana. Isabela em dobradinha com Willem Dafoe, o bandido Bobby Peru de dentes podres e cara de tarado, acaba traindo o protagonista.

Em pontas aparecem Crispin Glover como o primo maluco que gosta de enfiar baratas na bunda, Freddie Francis como o velhinho que fala com voz de desenho animado, Jack Nance como o cientista maluco com o cachorro imaginário. Frances Bay é a velha cafetina e Sheryl Lee é a bruxa boa.

O protagonista é Nicolas Cage. Todas as perversões de David Lynch podem ser engolidas, mas Cage bancando o fodão e imitando Elvis é de doer no saco. E num filme de estranhezas, alguém ruim por natureza não ajuda em nada.

A música pra variar, é de Angelo Badalamenti, com algumas composições de Lynch. A fotografia que abusa do laranja e do vermelho é um show de Frederick Elmes.

O filme ganhou a Palma de Ouro em Cannes na época e permanece com o brilho intacto, seja no seu contexto de ópera tresloucada pós-moderna ou na firmeza de Lynch em cruzar tanta esquisitice com maestria.