domingo, 6 de fevereiro de 2011

Mais aqui do que além

ALÉM DA VIDA

Aos 80 anos de idade, o velho coiote Clint Eastwood não precisa provar mais nada para ninguém, montado no reconhecimento daqueles que o encaravam apenas como o cowboy durão ou o policial brucutu dos anos 70. Andei lendo algumas besteiras por aí dizendo que apenas nesse filme ele exercita o seu lado dramático. Parece que essa gente nunca assistiu As Pontes De Madison ou Menina De Ouro. De bronco, ele só tem a cara e o background de ex-pistoleiro. Enquanto diretor, Clint sabe lidar muito bem com emoções.    

Seu novo filme é uma história de possibilidades de vida diante de experiências próximas da morte, garantido pela sublime beleza plástica, resultado da habilidade de um excelente realizador, capaz de juntar a fotografia hipnotizante de Tom Stern aos acordes líricos da trilha sonora de sua autoria para aconchegar o roteiro delicado e eficiente de Peter Morgan, mais conhecido por excelentes dramas históricos como O Último Rei Da Escócia, Frost/Nixon e A Rainha.

Morgan, apesar do ceticismo declarado em entrevistas durante a produção do filme, lida com a espiritualidade de maneira contemplativa, questionando o limiar entre vida e morte no desenvolvimento quase onírico do filme em trama fragmentada cheia de coincidências que devem acontecer para impulsionar o interesse nas três visões distintas de pessoas normais, confusas entre a presença da morte e a paixão pela vida. Antes de descobrirem o que os espera no além, os protagonistas tentam enxergar o mundo terreno de outra forma, lutando para fugir da dor e do esquecimento.

O elenco abraça a causa com louvor, contribuindo para o clima lírico e emocionante. Matt Damon consegue superar as atuações de cara dura e cria um personagem atormentado por um dom que mais parece maldição. Cécile De France é a jornalista diante de uma nova realidade ignorada pelo mundo, após sobreviver a um impressionante tsunami na abertura do filme, de fazer inveja a Michael Bay e provando que Clint também sabe lidar com pirotecnia.

Os pequenos britânicos Frankie McLaren e George McLaren revezam-se nas atuações dos gêmeos Marcus e Jason, com as atenções voltadas para Marcus, vítima do luto incessante e da saudade. E sempre que as câmeras do filme passeiam pela Inglaterra, confesso que meu coração vibra de maneira delirante. Também andei pela estação de Charing Cross, onde uma emocionante surpresa aguarda o pequeno Marcus.

No apoio, resta a beleza de Bryce Dallas Howard em  momentos envolventes de romantismo cotidiano, a ganância deslumbrada de Jay Mohr, a participação do grande Derek Jacobi como ele mesmo e uma pontinha de Marthe Keller, musa suíça dos anos 70 vista em obras-primas como Maratona Da Morte, Domingo Negro e Fedora.

Terminado o filme, fica a certeza de que Eastwood, dialogando com a morte está mais preocupado com os vivos. Quando ele direciona suas lentes para um tema tão unânime em sua filmografia, deixando o drama surgir de maneira pacífica, Clint proporciona aos sobreviventes uma certa ânsia amorosa de procurar nessa vida as soluções para os mistérios do além da vida, intrigando os céticos, agradando quem curte as idéias espiritualistas e emocionando meio mundo de leigos.

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