domingo, 14 de novembro de 2010

O filme dos sonhos



Lá pelas tantas, Leonardo DiCaprio pede para Ellen Page criar um labirinto e então Christopher Nolan desafia o espectador a encarar o seu próprio labirinto, um roteiro que levou dez anos para ser afinado e reescrito infinitas vezes para chegar ao que estamos assistindo, uma reciclagem magnética e bem realizada de velhas fórmulas, com a sabedoria de Nolan, um cara que em breve encontra o caminho da roça e define sua identidade estética.  

A Origem tem uma linha narrativa cheia de mirabolâncias e todas fazem sentido quando agarramos as infinitas pontas com muita atenção, esperando a junção no final. É a história dentro da história, meio cartilha explicativa sobre os  mecanismos do inconsciente, intercalado com cenas de ação e efeitos de tirar o fôlego. Entram no caldeirão Phillip K. Dick, mitologia grega, artes plásticas, xadrez, George Lakoff e um caminhão de referências, pequenas malandragens que permanecem até os minutos finais para criar pontos de interrogação na cabeça de quem assiste e estimular a criação de diferentes teorias em mesa de boteco. 

Está muito longe de ser onírico e viajão, como falaram por aí. Onírico mesmo, ao pé da letra só o Lynch, e com certeza o Jodorowski. Esses são os caras que colocaram sonhos e pesadelos em celulóide. Nolan não faz nada disso e organiza a história sem dar muita margem para a psicodelia. Nem o sexo, um elemento forte no mundo dos sonhos, teve chance de participar. A subversão é delicada.

Um vislumbre desta trama já estava em Amnésia, que parecia ser sobre o cruzamento de sonho e realidade, força motriz deste filme cheio de elipses e reviravoltas inovadoras que lutam para escapar dos clichês e transformar a realidade na inatingível matéria dos sonhos, bagunçada e invadida com naturalidade por pessoas normais. Para vivê-las, Nolan escolheu um elenco condizente com o espetáculo.   

Di Caprio é Cobb é o anti-herói, tentando refazer a vida, remoendo um amargor semelhante ao de Ilha do Medo. Ellen Page é Ariadne, com a mesma função de sua antecessora grega na história de Teseu.

Joseph Gordon-Levitt, Dileep Rao e Tom Hardy ajudam a formar o dream team com simpatia. Cillian Murphy é o objeto de desejo dos invasores de sonhos. Ken Watanabe é o causador da história. Na lanterna, Michael Caine aparece em ponta como o senhor da razão. Tom Berenger é o executivo suspeito, Pete Postlethwaite é o moribundo e Lukas Haas pode ser visto no começo.

Marion Cotillard é o mal absoluto até no nome e tenta colaborar com a emoção em um filme que é todo razão. Brincadeira a parte, Cotillard está em cena e Edith Piaf está na trilha sonora cantando Je Ne Regrette Rien, cuja letra salva os personagens de lembranças e acontecimentos que precisam ser esquecidos.

Enquanto diretor, Nolan é um artesão excelente em revolucionar o jeito de contar uma história e fazer muito dinheiro de forma inteligente. Pra chamar Nolan de Kubrick, só na base do faturamento. Depois do sucesso de Batman, ele é menina dos olhos da Warner, que baixa as calças para o rapaz.

A Origem é apenas um projeto pessoal realizado na plenitude de um orçamento gigantesco, resultando num entretenimento pomposo e divertido desde seu nascimento, quando a Warner de olho no dinheiro, adiantou a trama e inseriu em todo o mundo a idéia de que este era o melhor filme da década. 


E como cada década tem seu fenômeno, este já foi imortalizado.

2 comentários:

De França disse...

Eu ache a trilha sonora foda... o jeito que "Je Ne Regrette Rien" foi desacelerada pra virar aquele pooommm.. poooom.. pooommm, como uma alusão a explicação que nos sonhos tudo acontece mais lentamente.

Curti o filme do Nolan, da aquela sensação que eles não vão conseguir o que querem, tu torce pra que tudo de certo e fica meio aflito com todo aquele movimento.

mas fiquei puteado com o final.. Truquezinho barato.

tablis disse...

eu ainda acho que foi tudo sonho e caine era a voz da razao, da cabeça do dicaprio